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ALTA ROTATIVIDADE ou a grande debandada no mundo do trabalho

Escrito por Marco Ornellas

 

O que significa estar empregado?

Essa é uma pergunta que precisaria ser mais analisada, a partir das respostas. Claro que os cenários podem variar muito, mas podemos pensar em alguns deles: pode significar estar fazendo algo que você ama e ainda é muito bem pago para isso? Significa fazer algo que você apenas tolera, em troca do que dá segurança econômica? Ou – no pior cenário – significa fazer algo que você realmente detesta, pelo mínimo necessário para a sua sobrevivência e da sua família?

Essas e outras situações, quando cruzadas com a vontade de crescer profissionalmente, podem estar entre as maiores causas de pedidos de demissão voluntários. Claro que as variáveis são inúmeras, mas com um fenômeno que começou a se desenhar nos Estados Unidos e recebeu o nome de Great Resignation. Lá, todos os meses, um número superior a 4 milhões de trabalhadores pedem demissão, voluntariamente. Algo que pode parecer mais tranquilo, em um país que registra um taxa de desemprego de 3,9%.

Brasil, 2022, 13 milhões de desempregados ou 11,6% da população. Mesmo com esse índice em queda, fica a pergunta: quem se arrisca a pedir demissão? E vem a resposta: 500 mil pessoas, todos os meses. Surpreendente não? E tem mais, esse é um número duas vezes maior que antes da pandemia, segundo dados de um estudo da Você S/A.

O que o estudo mostra – e aí há uma equivalência entre Brasil e Estados Unidos – é a influência da pandemia nesse fenômeno. O aumento das demissões voluntárias agora, que caminhamos para uma esperada estabilização só tem aumentado. Uma das causas apontadas, é o Home Office, que parece ter despertado muitos para a falta que a qualidade de vida fazia em suas vidas.

Para mim esses números confirmam o movimento de tomada de consciência que temos feito na vida. Parar, refletir, avaliar por que fazemos o que fazemos e como fazemos? O que tem valor para mim? Qual estilo eu quero para a minha vida? É, estamos em uma nova era, era da consciência, do que fazemos e porque fazemos.

E isso parece muito natural. O mundo que a maioria de nós conhecia e que aceitava como “normal”, como padrão, era aquele em que trabalhar significava levantar cedo, sair de casa, enfrentar trânsito, comer na rua e ficar longe da família. E de repente – muito de repente mesmo! – se já havia alguma consciência dessa vida ingrata e inútil, alguns de nós vimos que é possível trabalhar em casa, com a mesma eficiência e produtividade (senão maior), sem o stress do trânsito, economizando com transporte e alimentação, comendo melhor, com mais tempo para si e para a família.

Claro que o Home Office não é uma realidade dourada, como já escrevi em outros artigos, longe disso, em muitos casos, trouxe problemas, outras tensões nas relações de trabalho, mas é inegável que apontou um caminho, abriu uma porta, detonou preconceitos e pôs em prática o que era só conjectura.

Como voltar para aquela realidade, depois de experimentar essa? É difícil quando vimos que podemos fazer diferente e sermos mais felizes. Bem difícil e as empresas devem estar atentas a isso. Mas como?

Antes da pandemia, a percepção da importância da qualidade de vida no trabalho já se impunha. Se as empresas tivessem se empenhado mais, entendido melhor essa necessidade, se antecipado, além de proporcionarem ambientes melhores para seus funcionários, também teriam enfrentado o imprevisto inimaginável que foi e é essa pandemia, muito mais preparadas.

Os números do estudo são um reflexo disso. A rotatividade das vagas em carteira, por demissão voluntária, estão em alta. As causas, claro, são várias. Mas mais do que pensar nelas, individualmente, é interessante pensar nessa relação de trabalho, que sempre existiu. Quer fosse um sapateiro da Idade Média ou uma empresa online hoje, o processo reproduziu ao longo das várias revoluções industriais, a autoridade de um poder que escolhia com a única pergunta feita: o que essa pessoa tem a oferecer para o meu negócio? O processo

Por mais que estejamos em pleno século XXI, essa mentalidade ainda baliza muitas empresas, ainda que não assumidamente. Mas não é mais possível ter essa pergunta sem a sua contraparte, sem que uma empresa se pergunte o que pode oferecer a seus colaboradores.

O que o estudo mostra é que esse poder migrou, em parte, para os trabalhadores, que ao não encontrar uma resposta satisfatória, com as condições de trabalho que procura, sai em busca de outra colocação, determinando que a relação mudou de ser recrutado e selecionado para uma posição de poder de escolha. Não são mais as empresas que escolhem e selecionam, agora elas são escolhidas, cabendo a elas somente se mostrarem verdadeiramente, como em uma vitrina, expostas para serem escolhidas e “compradas”.

Você já havia pensado nisso?

E esse mesmo movimento vale para o consumidor, que hoje escolhe o produto com base nessa transparência e verdade, isso também vale para os investidores, que escolhem onde irão colocar seus investimentos e apostar no futuro.

Do ponto de vista de uma empresa, nem é preciso dizer o que essa grande debandada ou alta rotatividade significa. Por menor que seja o investimento em seleção, integração, formação e desenvolvimento de alguém à cultura ou ao ambiente da empresa, é sempre um impacto, ter esse movimento de contratação em eterno movimento. Falamos de impactos financeiros, de tempo, de continuidade e previsibilidade na relação com os clientes, impactos também na integração, colaboração e confiança nas equipes.

Semana passada, visitando o escritório de uma grande empresa multinacional , recentemente reformado e preparado para receber os colaboradores, depois de quase dois anos fechado por conta das medidas restritivas pelo covid-19, o VP de RH confidenciou para mim: “nossos escritórios estão prontos para receber nossos colaboradores, mobiliado e organizado com muito carinho, só não sei quem virá”.

Novos tempos, eu diria.

Meio milhão de pessoas pedindo demissão por mês são números que não podem ser ignorados. É um recorde nunca visto por aqui. E quando falamos “aqui”, é sempre bom lembrar que estamos falando de um país com 11,6% de desemprego. É preciso olhar para esses números e entender o que eles significam mesmo considerando as novas e mais claras regras, editada pelo governo, para o trabalho híbrido. E mais ainda, se perguntar e questionar:

  • A nossa organização está preparada física e culturalmente para se movimentar nessa nova relação de trabalho?
  • Nossa liderança está preparada?

E você?

  • O que tem valor verdadeiramente hoje na sua vida?
  • O que vc não abriria mão em nome da realização profissional?

Perguntas essas que não querem calar e vieram para ficar em um tempo de alta rotatividade ou de grande debandada no mundo do trabalho.

 

Artigo escrito por Marco Ornellas – Consultor e CEO da Ornellas Community

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