Curadorias

Teremos um novo perfil de CEOs no pós-pandemia?
Artigo de José Luiz Bichuetti

Definitivamente, este não tem sido um ano fácil para os líderes empresariais – mesmo para aqueles muito resilientes. Além de serem responsáveis por garantir a sobrevivência de seus negócios e a manutenção de dezenas, centenas ou milhares de empregos em um cenário ainda muito incerto, esses profissionais têm também de lidar com as questões pessoais e familiares, como o medo da morte, perda de familiares e os impactos emocionais do isolamento.

Tenho refletido sobre quais mudanças efetivas essa pandemia promoverá, como legado positivo, no papel dos CEOs. Nota-se, por exemplo, uma boa receptividade com relação à aproximação entre vida pessoal e profissional. A maioria daqueles com quem converso tem achado muito bom estar mais perto da família neste período, mesmo que seus filhos atrapalhem alguma videoconferência, a internet de casa não seja tão potente ou que a decoração de sua sala esteja à mercê de críticas.

A pandemia fez (e ainda está fazendo) uma boa parte dos executivos refletir de uma forma profunda sobre suas vidas. Obrigados a passar 24 horas por dia dentro de casa por meses, muitos de meus clientes confessaram terem tomado consciência de papeis que antes negligenciavam: nas funções da casa, do pai e mãe presentes de verdade, dos pais que acompanham a atividade escolar dos filhos. Vi também pais dando muito mais valor aos professores, reconhecendo o desafio que eles têm de educar seus alunos, mas também a dificuldade que é lidar com os comportamentos, humores e anseios das crianças.

Essas reflexões têm se estendido ao trabalho. Todas as emoções geradas a partir de suas próprias experiências e dificuldades tendem a torná-los mais empáticos com seus subordinados. É através desse olhar para si que eles passam a prestar atenção na dor e na fragilidade do outro. Foi na pandemia que os gestores conheceram as diferentes realidades da vida de seus funcionários e observaram que essa separação entre profissional e pessoal na verdade nunca existiu.

Mas, ainda assim, vejo graus bem diferentes de empatia e sensibilidade entre meus clientes e outros executivos. Com raras exceções, aqueles que atuam em empresas ou setores da economia mais afetados pela crise têm demonstrado um grau de envolvimento emocional durante a pandemia muito maior e mais genuíno com seus funcionários do que aqueles cujos negócios tiveram bons resultados e estão passando com maior tranquilidade pelo período. Apesar de todos terem vivido o isolamento, a maior parte dos que sofreram menos pressão no negócio enxergou os problemas como números – quantas pessoas ficaram doentes, quantas voltaram, quantas morreram -, enquanto nos setores em que tudo foi mais complicado a questão humana veio mais à tona.

Uma coisa é certa: daqui para frente, as organizações precisarão promover uma discussão sobre novos rituais de liderança. São raras aquelas que já estavam prontas para um novo modelo de trabalho. Há de se estudar como funcionará um ambiente corporativo em que se tem às vezes 40% da equipe trabalhando uma parte da semana, 40% trabalhando outra parte, mais uns 20% que devem ficar em casa. A mentalidade dos líderes, assim como a dos subordinados, precisará se adaptar a essas novas experiências.

Não é uma transformação simples, afinal não se muda comportamento de uma hora para outra. O que eu espero, de verdade, é que essa mudança seja para melhor e que gere líderes mais sensíveis e empresas mais humanas.

 

Vicky Block é professora da FGV, da FIA e fundadora da Vicky Bloch Associados. Coach de CEOs, atua em processos de sucessão familiar e formação de lideranças.

Artigo publicado no site Valor Economico – Carreiras, no dia 01.10.2020

https://valor-globo-com.cdn.ampproject.org/c/s/valor.globo.com/google/amp/carreira/coluna/teremos-um-novo-perfil-de-ceos-no-pos-pandemia.ghtml

 

 

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