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LIDERANÇAS TÓXICAS

Escrito por Marco Ornellas

“A America nunca será destruída de fora para dentro.

Se nós fraquejarmos e perdermos nossas liberdades, será porque nós destruímos a nós mesmos.”

Abraham Lincoln

O cinema e a televisão têm o poder de transformar lugares em que nunca estivemos em paisagens familiares. Assim é com o National Mall, a grande área verde onde está localizado o Lincoln Memorial (aquela estátua onde o Lincoln está sentado, como que em um trono) e o Monumento a Washington (aquele obelisco, de frente ao espelho d’água). A área ainda tem ao redor, o Capitólio dos Estados Unidos e a Casa Branca, sede do governo. Além de terem sido usados como cenários de incontáveis filmes e séries, também foram palcos de várias manifestações ao longo dos anos, especialmente durante a década de 60, com os movimentos a favor dos direitos civis dos negros e contra a Guerra do Vietnã. Todo aquele espaço tem uma identificação muito forte com a luta por democracia e liberdade. Ok, sabemos que isso pode ser mais uma idealização do que realidade, mas o simbolismo é forte. E símbolos têm poder. Como dissemos, a três quilômetros da estátua de Lincoln, no extremo oposto do National Mall, está o Capitólio, prédio que é o centro legislativo do país e reúne tanto o Senado quanto a Câmara, e que na semana passada, fortes imagens entraram para a História, com o ataque realizado por apoiadores de Donald Trump à sessão que iria confirmar a eleição de Joe Biden e Kamala Harris. Tem aquele velho ditado que diz que nosso pior inimigo somos nós mesmos. O que é verdade em vários aspectos e pode ser estendido a quando falamos em países ou sociedades. No caso da americana, o que vimos acontecer na semana passada é um grande reflexo disso. Quando se tem como líder alguém tão envolto em ignorância, amor próprio e apego ao poder, o resultado dificilmente vai ser positivo. A condução catastrófica do país em meio à pandemia tem custado mais a vida de americanos do que de qualquer outra nacionalidade, com o Brasil logo atrás.  Desde os primeiros dias de 2021, o número de mortos tem ficado acima de 3 mil por dia, tendo ultrapassado 4 mil na quinta-feira, dia 07 de janeiro. É como se fosse um 11 de setembro por dia, com ainda mais mortos. Talvez seja um modelo de liderança que está se aproximando de um esgotamento. Concentrar tanto poder na figura de uma só pessoa já se provou um erro na História de vários países. Para citar Lincoln outra vez, “se você quer testar o caráter de um homem, dê-lhe poder”. Como sabemos bem, muitos não passam no teste. O mal não está somente no que um líder efetivamente faz, mas também no que ele leva outros a fazerem. Afinal, símbolos têm poder e, no caso de presidentes, eles podem servir de exemplo para uma grande parte da nação. Segundo a Time, logo depois de Trump sugerir que injeções de desinfetante ou de água sanitária poderiam derrotar o coronavírus, os casos de envenenamento por essas substâncias aumentaram 121% em relação ao mesmo período no ano anterior. No Brasil, podemos ver o mesmo efeito acontecendo no que se refere ao uso de máscaras, onde o presidente se nega a usá-las em suas aparições, o que encoraja outros a segui-lo. No mundo corporativo, como falamos no último artigo, já estão aparecendo modelos de gestão onde não há a centralização de poder em volta de um único indivíduo, onde a liderança é dividida entre outras pessoas. Será que um modelo desses funcionaria dentro do nosso sistema político? Talvez um dia, especialmente se já tivermos testados com sucesso dentro de empresas ou outros países e, principalmente, se tivermos uma sociedade mais consciente e madura. A busca por outros modelos de gestão deve ser incentivada também por isso, para além das melhorias que podem ser feitas diretamente a todos os stakeholders. É preciso que o pensamento voltado ao coletivo e ao entorno esteja cada vez mais presente, em todos os meios e em todos os níveis. Enquanto avançamos em consciência e maturidade social, precisamos criar mecanismos para identificarmos e nos defendermos de líderes tóxicos. Sociedades não deveriam eleger presidentes que podem representar uma ameaça às instituições e ao próprio povo que o elegeu, mas muitas vezes caem nesse erro. Organizações deveriam avaliar melhor os candidatos à promoção, sucessão ou contratação. Ainda há muitos líderes tóxicos em nossas empresas. No caso americano, estamos vendo que o sistema consegue absorver os impactos, mas não sem prejuízos. Há pouco tempo, um artigo na revista Psychology Today dizia haver uma tendência de crescimento das lideranças tóxicas. Por que isso ainda é possível hoje em dia? Porque esse tipo de liderança ainda é valorizado em alguns lugares e acabam conseguindo resultados, ainda que, para isso, seja preciso que se feche os olhos para assédios morais de todos os tipos. Lideranças que tenham qualquer traço de toxicidade não podem ter mais vez na nossa sociedade, qualquer que seja a posição, pública ou privada. Ao mesmo tempo, temos que ter consciência de que somos cúmplices toda vez que permitimos que algo assim aconteça, seja por atos ou omissão. É chegada a hora de buscarmos formas diferentes de gestão e governança e também nos opormos energicamente às velhas, ao que está ultrapassado. É chegada a hora de avaliarmos melhor as candidaturas à cargos públicos e as seleções de líderes nas organizações. Richard Buckminster Fuller disse: “Você nunca muda as coisas lutando contra o que já existe. Para mudar alguma coisa, construa um novo modelo que faça com que o modelo atual se torne obsoleto.” Lincoln concordaria. Era mais ou menos isso que ele colocou em palavras, há quase duzentos anos atrás: “Precisamos pensar de uma nova maneira e agir de uma nova maneira e, então, salvaremos o nosso país.” Troque país por empresa ou por planeta e a frase continua mais atual do que nunca.   Artigo escrito por Marco Ornellas – Consultor e CEO da 157next.academy
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